Sobre as ideias…
A propriedade intelectual (PI) é a área do direito que busca incentivar a inovação por meio da concessão de propriedade e monopólio sobre determinado conhecimento ou obra para o autor. No entanto, se PI incentiva inovação, isso ocorre a um custo de que aquele conhecimento estará indisponível somente por determinado tempo e, posteriormente, poderá ser utilizado livremente pela sociedade como um todo.
Assim, a propriedade intelectual como instituto somente tem razão em existir na medida em que seja limitada e que permita que a sociedade venha, eventualmente, a usufruir daquele conhecimento.
Posso proteger minha propriedade intelectual?
O primeiro ponto é que não são protegidas ideias pura e simplesmente. Somente a partir do momento em que a ideia toma corpo ou é expressa de algum modo que poderá ser protegida.
Outra opção teria sido a criação de um MVP (Minimum Viable Product). Por dar corpo e funcionamento à ideia, mesmo que de modo rudimentar, o MVP já a imbui com os requisitos necessários para que venha a ser protegida como PI. Nota-se que não é necessário que uma ideia seja absolutamente nova para ser protegida.
Além disso, é evidente que a linha entre originalidade e cópia – entre inspiração e plágio – é tênue. Tratando-se do mercado de startups, é extremamente comum ver modelos de negócios bem-sucedidos replicados por concorrentes no mesmo âmbito territorial. Quer ver?
Exemplos de inspirações de ideias
Pode-se citar como exemplo o Uber, copiado pelo Cabify e pelo 99Pop. Outro exemplo é o aplicativo de relacionamento Tinder, que teve seu conceito básico copiado e adaptado para um nicho específico ou demandas específicas por diversos outros aplicativos; do Hater, que une pessoas com base no que os parceiros em potencial odeiam em comum, e do Feeld, voltado para pessoas com interesses românticos mais grupais.
Como o exemplo dos aplicativos de relacionamento ilustra, a própria ideia, seu aproveitamento comercial, métodos relacionados, planos e outros esquemas, tudo que não for original e fixado em suporte está fora do âmbito da Propriedade Intelectual.
Como registro minha propriedade intelectual?
Para marcas, patentes, design (todos de propriedade industrial) e softwares, é indispensável que seja realizado o registro no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI).
Devo divulgar minha ideia?
Aqui a questão é a confidencialidade ou circulação das ideias. Uma dúvida comum entre empreendedores é sobre a divulgação das ideias. O consenso geral é de que, para o sucesso de startups, é importante que as ideias circulem, ou seja, que os autores possam ouvir a opinião de outros (mentores, por exemplo), comparar o que têm em mente com o que outros empreendedores pensam.
Isso é extremamente importante uma vez que facilita a incorporação de sugestões e o aprimoramento da ideia original. Evidentemente, há uma preocupação de que outras pessoas possam roubar a ideia. No entanto, muitos argumentam que a ideia, em si, não é de muito válida no contexto de startups, mas sim a capacidade que a equipe tem de executar a ideia de maneira eficaz.
De tal modo, executar e tornar operacional a ideia é o que acabe gerando valor ou interesse.
Stealth Startups
Ainda há quem opte por desenvolver seus projetos de forma oculta, ao menos, até o MVP ser lançado ou alguma outra forma de validação da ideia acontecer. Essas startups, que ganharam o apelido de stealth startups (startups ocultas), buscam, por meio da confidencialidade, prolongar ao máximo a entrada de outro competidor no mercado, ainda que algum competidor entre no mercado antes, custando para a startup a vantagem de ser a primeira.
Um exemplo disso é o Segway, que teve sua produção inicial limitada a poucos indivíduos e, curiosamente, acabou por incorporar poucas sugestões dos funcionários no projeto lançado inicialmente. O resultado dessa postura foi prejudicial para o sucesso do produto e para o deslanche comercial do mesmo.
Pivotagem
Embora os unicórnios dos negócios sejam os mais prevalentes no imaginário popular,, eles são extremamente raros. Por outro lado, somente é necessário um único acerto de empresa para os fundadores. De tal modo, uma estratégia comum é a chamada pivotagem ou giro de pivô.
Essa estratégia consiste, basicamente, em face de novas informações ou de fracassos, readaptar a ideia original em busca de uma ideia que dê certo. Essa busca por alternativas se adequa também à abordagem de aprendizado por tentativa e erro mencionada por Sommer et al ao tratar de metodologias que podem ser utilizadas para lidar com os riscos em startups, além de ser uma opção e uma postura de negócios muito bem-aceita no Vale do Silício, e de produzir resultados.
Assim, o acerto em startups não acontece em uma única tentativa, mas em sucessivas adaptações e reconstruções da ideia original. De tal modo, é importante saber o momento no qual a ideia deve ser adaptada em prol do sucesso do projeto, independentemente do apego que se tenha à ideia original.
Durante essas reinvenções da ideia, é importante que cada melhoria, adaptação ou completa alteração do conceito original seja devidamente registrada (nos exemplos antes referidos) ou depositados perante os órgãos governamentais (no exemplo do INPI), para que se consolide e fortaleça a proteção da criação perante terceiros, principalmente, os que tiveram acesso a alguma dessas interseções ao longo do tempo.
No mesmo sentido de proteção da ideia da startup, além do argumento com base na propriedade da ideia, no plágio e de violação do direito autoral ou da propriedade intelectual, há o argumento no âmbito da concorrência desleal. Quem tiver contato com a ideia antes da divulgação ou durante seu desenvolvimento e agir com o objetivo, direto ou indireto, de utilizar para si ou para causar prejuízo a startup original, utilizando-se do conhecimento que obteve em razão de seu acesso prévio à ideia, estará violando os direitos intelectuais ou praticando concorrência desleal.
Evidentemente, não se espera que qualquer empregado, sócio ou investidor (atual ou não) venha a cometer atos de concorrência desleal. Não obstante, essa é uma situação que pode acontecer, principalmente, em cenários nos quais há muito envolvimento emocional, como costuma ser o caso de startups.
Memorando de entendimentos (MoU)
Considerando que, muitas vezes, não há o interesse nem a possibilidade de utilizar recursos para iniciar a empresa – pelo menos, no momento inicial, chamado de bootstrapping –, a criação de uma estrutura jurídica (como a constituição de uma sociedade, por exemplo) pode ser excessivamente onerosa, principalmente, se considerados os custos e burocracia envolvidos.
Uma opção que pode ser utilizada para evitar essas barreiras é por meio de um memorando de entendimentos (memorandum of understandings ou MOU, em inglês). O MOU é um contrato atípico, ou seja, não possui regulamentação específica, que pode ser celebrado entre quaisquer partes. No contexto de startups e buscando proteger os bens intelectuais do negócio, pode-se celebrar o MOU entre os fundadores da empresa, independentemente de qualquer formalidade, em particular do registro em órgãos governamentais. Vale mencionar que, nesse contexto, o contrato também pode receber outros nomes, tais como Acordo de Associação, Memorando de Entendimentos para Constituição de Sociedade, Pre-shareholder Agreement e outros. O fato é que, por não haver regulamentação específica, o título do contrato é irrelevante para sua eficácia jurídica.
Na prática, o que os fundadores estabeleceriam nesse contrato é a obrigação de constituir uma sociedade. Essa obrigação pode não ter nenhum tipo de prazo, caso em que o contrato teria pouca efetividade, ou estar condicionada a algum evento futuro certo ou incerto (não é necessária a certeza de que o evento futuro ocorra). As opções são muitas e só dependem do acordado entre as partes, podendo ser, entre outras, a captação de recursos de terceiros, o depósito de alguma patente no INPI, a elaboração e aprovação de plano de negócios – até que os fundadores possam se dedicar, exclusivamente, à startup – o simples decurso de tempo (um ano após a assinatura, por exemplo), entre outras varias e criativas formas.
O ponto é que os fundadores podem eleger qualquer tipo de evento, sendo comum que seja escolhido alguma ocorrência relevante para o sucesso da startup ou algum tipo de requisito que antes não existia.
Fonte: Direito Startups 2022 Rev EA – FGV Online
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